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domingo, 9 de janeiro de 2011

A Morte de Carlos Castro

Há trinta anos, quando apresentei o meu primeiro romance, era um autor desconhecido que dava os primeiros passos no dificil mundo editorial e não esperava desse título - Bastardos - outra coisa que não fosse o entreabrir da porta que me levasse a realizar o grande sonho de ser escritor. A editora nem apostou no livro. Fui eu e uns amigos que organizámos o lançamento, pago da nossa algibeira. Foi através de outros amigos que procurei divulgar aquele livrinho, que na verdade não passava de um livrinho, mas que naquele tempo era tão grande, tão importante dentro dos meus sonhos, que mereceria farta divulgação. O Martins telefonou-me: Vai ao lançamento um tipo que pode ajudar-te na divulgação dos Bastardos. Chama-se Carlos Castro. E foi.Era o único jornalista presente.
Surgiu com um fotógrafo e assistiu com agrado à apresentação feita pelo Luis Filipe Costa.E sei que divulgou abundantemente o livro por revistas e jornais em que colaborava. Nunca mais esqueci este gesto de generosidade com um jovem escritor e livro após livro tornámo-nos amigos. Quando publiquei um dos meus últimos romances, ralhei com ele. - Eh, pá, deixaste de aparecer no lançamento dos meus livros.
Respondeu com uma gargalhada: Já não precisas de mim.
Na noite em que terminou a série a Ferreirinha, que escrevi para a RTP, e onde a Filomena fazia o papel de D. António (o episódio descreve a morte da senhora) e reconheço que foi um dos meus trabalhos com melhor carpintaria dramática, entre as dezenas de telefonemas que recebi, falou-me o Carlos. Com a voz embargada de emoção a dar os parabéns, pediu-me para passar o telefone à Filomena e ter-lhe-á dito elogios que a vi chorar em silêncio a agradecida pelas palavras.
A última vez que nos encontrámos foi neste verão, numa inciativa do Correio da Manhã. Continuava o mesmo homem rebelde, simpático,bondoso, amigo dos seus amigos, corrosivo, irónico, bem disposto. Sabia que era homossexual mas não tínhamos proximidade suficiente para  conhecer o seu namorado/companheiro.Mas também sabia que impusera a sua presença, na comunicação social, através de muito sem preconceitos, através de muito trabalho e de muita paixão. Ainda não compreendi como foi tão barbaramente assassinado. Pior: ainda não me recompus da morte deste amigo que um dia, há muitos anos, chegou ao lançamento daquele livro, sozinho, sem tibiezas para incentivar o jovem escritor: se é este o caminho que escolheste, luta por ele. Sem desfalecimento.
Adeus Carlos. Não te queria dizer adeus, mas a brutalidade da tua morte obriga-me. Até um dia.

2 comentários:

  1. É extremamente chocante como os sonhos podem ser voláteis ...
    Como num ápice 2 seres humanos se tornam VÍTIMAS nesta sociedade podre em que a VIDA há muito deixou de ter valor.

    Um abraço

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  2. O que ainda me choca e que tentam a todo o custo denegrir a imagem do Carlos Castro com comentarios
    e opinioes, pelo simples facto de ele ser Homossexual.
    O renato, (coitadinho) segundo estas pessoas era um menino de coro que caiu na labia do Carlos Castro. Quem e que conhece quem,? como diz o Quintino Aires,nao ha uma mae que conheça o intimo dum filho, porque ha coisas que os filhos nao contam aos pais por mais amigos que sejam.
    Carlos Castro GOD BLESS YOUR SOUL.
    Um abraço

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